O amor tem jardim, cerca, projeto. O sexo invade tudo isso. Sexo é contra a lei. O amor depende de nosso desejo, é uma construção que criamos. Sexo não depende de nosso desejo; nosso desejo é que é tomado por ele. Ninguém se masturba por amor. Ninguém sofre de tesão. O sexo é um desejo de apaziguar o amor. O amor é uma espécie de gratidão posterior pelos prazeres do sexo.
O amor vem depois, o sexo vem antes. No amor, perdemos a cabeça,deliberadamente. No sexo, a cabeça nos perde. O amor precisa do pensamento.
O amor vive da impossibilidade sempre deslizante para a frente. O sexo é um desejo de acabar com a impossibilidade. O amor podeatrapalhar o sexo. Já o contrário não acontece. Existe amor sem sexo, claro, mas nunca gozam juntos. Amor é propriedade. sexo éposse. Amor é a casa; sexo é invasão de domicílio. Amor é o sonhopor um romântico latifúndio; já o sexo é o MST. O amor é maisnarcisista, mesmo quando fala em “doação”. Sexo é maisdemocrático, mesmo vivendo no egoísmo. Amor e sexo são como a palavra farmakon em grego: remédio e veneno. Amor pode ser veneno ou remédio. Sexo também – tudo dependendo das posiçõesadotadas.
Amor é um texto. Sexo é um esporte. Certos amores nem precisamde parceiro; florescem até mas sozinhos, na solidão e na loucura. Sexo, não – é mais realista. Nesse sentido, amor é uma busca deilusão. Sexo é uma bruta vontade de verdade. Amor muitas vezes e uma masturbação. Seco, não. O amor vem de dentro, o sexo vem defora, o amor vem de nós e demora. O sexo vem dos outros e vaiembora. Amor é bossa nova; sexo é carnaval.
Não somos vítimas do amor, só do sexo. “O sexo é uma selva de epiléticos” ou “O amor, se não for eterno, não era amor” (Nelson Rodrigues). O amor inventou a alma, a eternidade, a linguagem, a moral. O sexo inventou a moral também do lado de fora de suajaula, onde ele ruge. O amor tem algo de ridículo, de patético,principalmente nas grandes paixões. O sexo é mais quieto, como um caubói – quando acaba a valentia, ele vem e come. Eles dizem: “Faça amor, não faça a guerra”. Sexo quer guerra. O ódio mata o amor, mas o ódio pode acender o sexo. Amor é egoísta; sexo é altruísta. O amor quer superar a morte. No sexo, a morte está ali, nasbocas... O amor fala muito. O sexo grita, geme, ruge, mas não seexplica. Amor é literatura. Sexo é cinema. Amor é prosa; sexo époesia. Amor é mulher; sexo é homem.
O amor busca uma certa “grandeza”. O sexo sonha com as partesbaixas. O PERIGO DO SEXO É QUE VOCÊ PODE SE APAIXONAR. O PERIGO DO AMOR É VIRAR AMIZADE. Com camisinha, há sexo seguro, MAS NÃO HÁ CAMISINHA PARA O AMOR. Amor é o sonho dos solteiros. Sexo, o sonho dos casados. Sexo precisa da novidade, da surpresa. Amor é de direita. Sexo, de esquerda (ou não, dependendo do momento político. Atualmente, sexo é de direita. Nos anos 60, era o contrário. Sexo era revolucionário e o amor eracareta). E por aí vamos. Sexo e amor tentam mesmo é nos afastar da morte. Ou não; sei lá...
(Arnaldo Jabor)
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